sábado, 30 de junho de 2018

Serão todos elétricos


Aneel regulamenta recarga de veículos elétricos

Com informações da Aneel 




O mercado de veículos elétricos no Brasil ainda é pequeno principalmente pelo alto custo dos veículos.[Imagem: SPTrans/Divulgação]


Postos de recarga elétrica

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou a regulamentação sobre o recarregamento das baterias dos veículos elétricos.

Com isso, os empreendimentos interessados em prestar esse tipo de serviço, sejam eles distribuidoras, postos de combustíveis ou shopping centers, por exemplo, têm agora uma regulamentação básica, de forma a evitar interferências da atividade nos processos tarifários dos consumidores de energia elétrica.

A produção e comercialização de recarga já é feita em diversas partes do mundo para atender a demanda de carros elétricos.

Segundo Tiago Correia, da Aneel, a regulamentação aprovada reduzirá incertezas e, com isso, favorecerá investimentos do setor privado na infraestrutura de recarga de veículos elétricos.

O regulamento permite a qualquer interessado a realização de atividades de recarga de veículos elétricos, inclusive para fins de exploração comercial a preços livremente negociados, a chamada recarga pública.

As distribuidoras de energia elétrica podem também instalar estações de recarga em sua área de atuação destinadas à recarga pública de veículos elétricos.

A Aneel deverá disponibilizar, até 15 de outubro, um formulário eletrônico que permitirá que qualquer consumidor interessado envie as informações necessárias ao registro junto à Agência das estações de recarga em unidades consumidoras.

A expectativa da agência é de que a propulsão elétrica alcance uma posição relevante no país nos próximos 10 anos, ajudando na redução das emissões de gás carbônico e aumentando a eficiência energética do transporte rodoviário.


sexta-feira, 15 de junho de 2018

Judicialização brasileira


Breves apontamentos sobre a responsabilidade penal dos sócios e administradores de empresas

Leônidas Ribeiro Scholz




CONTINUAÇÃO











Em primoroso voto sobre o tema, pontuou o então ministro do STF Cezar Peluso:

"Como é vistoso, não se atribui aí, a esse nem àquele, nenhum comportamento criminal. O que esse fecho da inicial imputa aos denunciados é a responsabilidade pela administração da empresa, não a prática, sequer no exercício da mesma administração, de algum particular comportamento típico. Ser administrador de empresa não é por si só, escusaria dizê-lo, coisa criminosa, de modo que, porque o fossem em certas circunstâncias, deveriam ter sido descritas na denúncia, de forma minudente, ações e/ou omissões mediante as quais cada administrador teria, nessa condição, infringido ambas aquelas normas. A denúncia diz apenas: "Assim agindo..." Assim como?

Cumpria, pois, estivessem descritas, com todas as suas circunstâncias, as eventuais ações ou omissões que, praticadas, pessoal, consciente e finalisticamente, pelo primeiro réu, na específica qualidade de administrador das empresas, se amoldariam aos tipos penais. Ou, de forma mais descongestionada, cumpria à denúncia responder à seguinte questão: "o que fez ou deixou de fazer ... "??

(...)

A responsabilidade pessoal postulada por nosso sistema jurídico-penal significa que se caracteriza essa forma agravada de responsabilidade diante da existência de determinado fato imputável a uma pessoa física, a título de dolo ou culpa. Ou seja, tal responsabilidade pressupõe nexo psíquico que ligue o fato ao seu autor:

(...)

Ao desatender ao ônus de atribuir ao ora paciente ato ou atos concretos que teriam de algum modo concorrido para a realização dos fatos criminosos, era inevitável fosse o órgão acusador obrigado a atribuir os mesmos fatos ao ora paciente a título de responsabilidade objetiva.

Deveras, à medida que a denúncia não atribui ao ora paciente contribuição pessoal para a prática dos fatos supostamente criminosos ali narrados, se pode concluir que a atribuição, ou seja, o enlace entre o fato e o agente, é de natureza objetiva e, como tal, frontalmente contrário ao nosso sistema jurídico-penal positivo, formado, neste ponto, pelas normas insertas no art. 5º, incs. XLV e XLVI, da CF, nos arts. 13, 18, 20 e 26 do CP e, quanto aos crimes contra o sistema financeiro nacional, no art. 25 da lei 7.492/86.

O caso põe em expressiva evidência a instrumentalidade do processo penal relativamente ao direito penal material: a responsabilidade pessoal e subjetiva postula denúncia que atribua a autor determinado a prática de atos concretos como obras suas, por aderência psicológica (dolosa ou culposa).

(...)

Peço vênia para prestigiar entendimento já adotado desta Corte, verbis:

"HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSO PENAL. TRIBUTÁRIO. DENÚNCIA GENÉRICA. RESPONSABILIDADE PENAL OBJETIVA. INÉPCIA.

Nos crimes contra a ordem tributária a ação penal é pública. Quando se trata de crime societário, a denúncia não pode ser genérica. Ela deve estabelecer o vínculo do administrador ao ato ilícito que lhe está sendo imputado. É necessário que descreva, de forma direta e objetiva, a ação ou omissão do paciente. Do contrário, ofende os requisitos do CPP, art. 41 e os Tratados Internacionais sobre o tema. Igualmente, os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório. Denúncia que imputa co-responsabilidade e não descreve a responsabilidade de cada agente, é inepta. O princípio da responsabilidade penal adotado pelo sistema brasileiro é o pessoal (subjetivo). A autorização pretoriana de denúncia genérica para os crimes de autoria coletiva não pode servir de escudo retórico para a não descrição mínima da participação de cada agente na conduta delitiva. Uma coisa é a desnecessidade de pormenorizar. Outra, é a ausência absoluta de vínculo do fato descrito com a pessoa do denunciado. Habeas deferido" (HC n.º 80.549, 2ª Turma, rel. Min. NELSON JOBIM, vu, j. 20.03.2001. Grifos nossos. No mesmo sentido, HC n.º 79.399, rel. Min. NELSON JOBIM, j. 26.10.1999)."12

Em suma, pois, responsabilização penal de quem quer que seja, bem ao reverso de poder assentar-se na condição de sócio, administrador, gestor, gerente ou qualquer outra, inapelavelmente exige ação ou omissão individual (esta, contudo, somente se penalmente relevante – art. 13, § 2º, do CP) concreta e especificamente vinculada, tanto no plano material, como no psicológico (consciência e vontade) ao fato tido por delituoso.

4. O suposto alargamento da responsabilidade penal pela distorcida concepção da teoria do domínio do fato

Sob o título "Jurisprudência do mensalão deixa bancos e empresas apreensivos", divulgou o Valor Econômico matéria a teor da qual " (...) Qualquer executivo, a partir do mensalão, vai estar muito mais preocupado em assinar qualquer liberação de recursos para evitar o que aconteceu no caso do Banco do Brasil e do Banco Rural", afirma o gerente regional de compliance e segurança corporativa de uma multinacional presente em mais de 70 países, inclusive no Brasil. (...) Entre as novidades geradas a partir do confronto de posições dos ministros do Supremo, uma das mais eloquentes e preocupantes, segundo as fontes ouvidas pelo Valor, é a chamada teoria do domínio do fato. Usada pela primeira vez pela Corte para basear uma condenação criminal, ela permite que se atribua responsabilidade penal a quem pertence a um grupo criminoso, mas não praticou diretamente o delito porque ocupava posição hierárquica de comando. (...) O temor de advogados e empresários é o de que a teoria passe a motivar uma série de processos por crimes econômicos que coloquem, entre os réus, executivos e administradores de empresas pelo simples fato de que, em posição hierárquica superior, eles teriam, necessariamente, o domínio do fato - ou seja, saberiam de atividades ilícitas cometidas por seus subordinados. Esse receio foi externado durante o próprio julgamento pelo ministro revisor do processo, Ricardo Lewandowski. "Preocupa-me como os 14 mil juízes brasileiros vão aplicar essa teoria se essa Corte não der parâmetros para sua aplicação", disse. "Amanhã talvez o presidente da Petrobras possa ser responsabilizado por um vazamento de petróleo porque tem o domínio do fato."13

De fato e como anotei em breve ensaio sobre "o farto e variado mosaico de posturas e intelecções jurídicas, novas ou remodeladas, quando não também – pelo menos algumas – antinômicas entre si", produzido no supracitado julgamento, proclamou-se "responsabilidade penal por autoria intelectual à base da elastecida concepção de que a teoria do domínio do fato – germinada por Welzel em 1939 e aperfeiçoada por Roxin em 1963 – dispensaria conduta pessoal concreta e conscientemente conectada à realização do ilícito, contentando-se com a simples proeminência funcional ou ascendência hierárquica sobre os respectivos autores materiais."

Na sequência, porém, averbei: Emblemático viés "contemporâneo" do "direito penal de autor": "Fácil será, portanto, apontar, na história, períodos em que se pretendeu, por motivos religiosos ou por razões de Estado, fundar a pena criminal não naquilo que o "agente faz", mas no que "ele é" (...)" (Francisco de Assis Toledo. Princípios básicos de direito penal. 3ª ed. SP: Saraiva, 1987, p. 224). Ou seja: responsabilidade penal objetiva. E, mais, na contramão de taxativo pressuposto da própria teoria de Roxin: "(...) a posição de domínio somente pode ser concebível com a intervenção da consciência e vontade do agente. Não podendo, assim, haver domínio do fato sem dolo, compreendido como conhecer e querer os elementos objetivos que compõem o tipo legal" ("Só há domínio final do fato se houver dolo", Leonardo Issac Yarochewsky, com respaldo em magistério de Nilo Batista. Conjur, Artigos, 25/9/12)"14

A valer e como judiciosamente observou Fernanda Tórtima em alentadas reflexões sobre a matéria ("Poder mandar não significa mandei. A teoria do domínio do fato serve à distinção entre autor e partícipe de um crime, não para se comprovar a participação de um acusado"15):

Recentemente, o professor emérito da Universidade de Munique Claus Roxin, o grande especialista na teoria do domínio do fato, citada no julgamento da AP 470, concedeu algumas poucas entrevistas a respeito da teoria em questão, publicadas em periódicos brasileiros. Foi o suficiente para que se passasse a insinuar que o eminente jurista teria censurado nosso STF.

Nada menos verdadeiro. Pensar que Roxin teria criticado diretamente os votos proferidos durante o citado julgamento é, no mínimo, pueril. E divulgar essa ideia é leviano. É evidente que, apesar de nos ter brindado com uma breve visita ao RJ, para evento acadêmico, no final do mês de outubro, não teve oportunidade de ouvir, a respeito do processo, mais do que algumas explicações superficiais. Suas manifestações limitaram-se à reprodução, em caráter abstrato, de ideias que já vinham sendo por ele divulgadas há aproximadamente cinco décadas em diversas publicações científicas.

Por outro lado, as entrevistas por ele gentilmente concedidas, se observadas corretamente, como fonte de doutrina, fazem ver que a teoria do domínio do fato parece ter sido utilizada equivocadamente durante o julgamento da AP 470.

A bem da verdade, não é tarefa fácil compreender a forma como a teoria em questão serviu ao resultado condenatório. Falou-se, de forma descontextualizada, a respeito de domínio "final" ou "funcional" do fato; chegou-se a invocar a formulação dos aparelhos organizados de poder e, ao que parece, pretendeu-se inserir os enunciados da teoria na análise da prova dos autos, a ponto de se fazer crer que a identificação da posição hierárquica de alguns acusados dentro da estrutura de poder poderia contribuir para a presunção de que teriam eles participado de determinadas condutas criminosas. Em outras palavras, passou-se a impressão de que a mera circunstância de alguém ocupar elevada posição hierárquica fundamentaria a responsabilidade pela prática do crime.

Essa utilização da teoria do domínio do fato seria absolutamente incorreta. Não se pode, de forma alguma, mesclar suas premissas com a análise da prova de que alguém tenha concorrido para a realização de um crime. A teoria do domínio do fato serve exclusivamente à distinção entre autores e partícipes de um crime, após ter sido devidamente demonstrado terem os acusados concorrido para sua realização. A tese não é complexa: uma vez comprovado - e somente após isso - que determinado acusado contribuiu para a prática criminosa, verifica-se se ele o fez dominando os fatos. Em caso positivo, atuou ele como autor; caso contrário, como simples partícipe (mandante, isto é, instigador, ou cúmplice).

(...)

Mas o que não se pode conceber é que a teoria do domínio do fato seja utilizada para finalidades para as quais não foi desenvolvida. E ela não foi criada para fins de comprovação de que determinado acusado tenha participado de condutas criminosas.

Também se fez menção, em passagens do julgamento da AP 470, à formulação relativa aos aparelhos organizados de poder, desenvolvida por Roxin no âmbito da teoria do domínio do fato. A formulação fora corretamente utilizada no julgamento do ex-presidente Alberto Fujimori pela Corte Suprema peruana. Lá não se mesclou o uso da teoria com a análise da prova dos autos, apenas condenou-se Fujimori como autor, e não mero partícipe, considerando-se ter ele exercido, por meio de uma estrutura organizada de poder, o domínio da vontade dos autores que realizaram o tipo pelas próprias mãos (imediatos). Sem a teoria do domínio do fato, Fujimori não teria sido absolvido, mas condenado como partícipe.

Aqui, ao contrário, passou-se ao menos a impressão de que o decreto condenatório de determinados acusados - e não apenas a designação deles como autores ou partícipes - decorreu da aplicação da teoria do domínio do fato, o que, como se viu, importa em incontornável equívoco.

A teoria do domínio do fato ainda é pouco utilizada em julgados brasileiros. Não se pode deixar de lamentar que aparentemente se tenha recorrido ao seu uso de forma equivocada em um julgamento de tamanha repercussão. A preocupação não é apenas com as consequências do erro no caso de que estamos falando, mas sim com sua reprodução, possivelmente também errônea, em milhares de decisões judiciais a serem proferidas no país. A teoria do domínio do fato assumiu no julgamento da AP 470 ares de novidade. A adoção de teorias aparentemente herméticas, e, de toda sorte, conhecidas por uma parcela pequena da população e mesmo da comunidade jurídica, costuma servir de álibi para drásticas alterações de orientação de entendimento jurídico. A culpa passa a ser da "nova" teoria, como se ela não existisse antes, e como se servisse aos fins para os quais foi utilizada.

Logo, a atualmente tão decantada teoria do domínio do fato, uma vez depuradas as distorções jurídicas e as impropriedades técnicas que permearam sua utilização em sobredito julgamento e, assim, restabelecido seu real alcance, em nada e por nada atenua os requisitos da responsabilidade penal: conduta pessoal concreta e conscientemente conectada à realização do ilícito, seja ele qual for.

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1 Ressalte-se, por relevante: nos delitos culposos, necessariamente materiais, o “querer” restringe-se à conduta, a qual, voluntariamente realizada, mas com infração do(s) respectivo(s) dever(es) de cuidado, dá causa, sem intenção, portanto, ao resultado tipificado como infração penal.

2 Código penal interpretado. Organizador: COSTA MACHADO. Coordenador: DAVID TEIXEIRA DE AZEVEDO. São Paulo: Editora Manole, 2011, p. 33. Realces gráficos pela transcrição.

3 Comentários ao código penal. São Paulo: Saraiva, 1986, v.1 – parte geral. p. 34

4 Capítulos de direito penal: parte geral: com observações à nova parte geral do Código penal. São Paulo: Saraiva, 1985. pg. 34.

5 “Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstas nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la”

6 “São penalmente responsáveis, nos termos desta lei, o controlador e os administradores de instituição financeira, assim considerados os diretores, gerentes.”

7 Artigo 13 do Código Penal.

8 Código penal e sua interpretação jurisprudencial. 8ª ed. São Paulo: RT, 2007. Página 44. Nossos os realces gráficos.

9 “Duas formas de ciência da acusação, premissa para o pleno exercício do direito de defesa: acusação formal, certa e definida e acesso aos autos do inquérito policial”. In: Crimes econômicos e processo penal. série GV law. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 267

10 RHC 2.882/MS, 6ª T., Rel. Min. LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, j. 17.08.1993, DJ. 13.09.1993.

11 HC 15.051/SP, 6ª T., Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO, j. 06.03.2001, DJ. 13.08.2001.

12 HC 83.301-2/RS (DJ 06/08/2004). Páginas 04 e 09/12. Destaques gráficos: alguns no original, outros apostos pela transcrição.

13 Matéria integralmente reproduzida no Clipping Eletrônico da AASP (ASSOCIAÇÃO DOS ADVOGADOS DE SÃO PAULO) de 12/11/2012.

14 “Palavra pela ordem não serve só para questão fática”. Artigo publicado na Revista Eletrônica, Conjur, 16/10/2012.

15 In: O Estado de São Paulo – Notícias – 18 de novembro de 2012.

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* Leônidas Ribeiro Scholz é advogado do escritório Advocacia Criminal Leônidas Scholz.

FINAL